quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Felicidade


Brasília, 27 de janeiro de 2015



'Você não diz, mas balançou
Qual a razão e a vontade
Desperdiçou sexo do bom
Meu próprio som
E silêncio e outras raridades'

E sendo amor - Adriana Calcanhotto


Felicidade engorda. Senti na pele - e na balança - os ponteiros subindo de alegria por nada. Aí veio a desilusão - rasa, quero deixar claro. A fome aumentou. 

Desilusão boa é aquela que te arrasta e te afasta da geladeira. Te faz definhar. E a fome da tal desilusão rala e rasa bateu no meio da noite. Vou ao balcão da lanchonete e peço o mesmo sanduíche de ontem, queijo e peperone.

- 35 reais -   diz o atendente.


- Ele custa 35 reais? -  pergunto.


- sim, 39 reais com a Coca-Cola em lata -   responde já impaciente.


Como ele sabe que gosto de Coca-Cola? Não digo nada. Pago e procuro uma mesa na varanda. Tranquilamente, devoro minha desilusão barata.

Pessoas conversam, pequenos grupos no estacionamento falam sobre festas e badalações. Nada me apetece. 

De repente você se aproxima. Calça jeans,  camisa xadrez em tom de azul. Sorri de forma tão educada, puxa conversa - como você pode ser tão cabeça tranquila assim? - e eu me derreto toda.


- Não te vi na festa do barco. Você foi mesmo? -  diz você com o sotaque carregado.



Respondo com paz e serenidade: - Não deu. Fui a uma festa gay com alguns amigos - mesmo sabendo que confirmo presença em tudo que é evento e não compareço.

Deixo o sanduíche na mesa e fico na varanda com você. Encostado na parede você puxa meu braço, corre os dedos até minha mão esquerda e diz:  - Vai ter outra festa no barco. Quero que você vá comigo. Se quiser, podemos chamar amigos de fora, ninguém do trabalho.

Anestesiada e completamente feliz aperto sua mão direita e num sorriso te falo tudo que ainda está entalado.

Penso: ainda bem que tudo se acertou. Não vou te deixar escapar, não vou me sabotar, tudo vai ficar bem.

Você me olhou e - como de costume- sorriu com os olhos. É tão raro. É lindo. 

Te ofereci meu sanduíche. Você tirou o peperone e disse que estava com gastrite,  não queria uma nova crise. Foi pra fila pedir outra coisa. 

E eu? Perdi a fome. Não de desilusão, de felicidade extrema. Gargalhei por dentro. Desculpe se mudo de opinião assim tão facilmente,  mas felicidade também te rouba alguns números no manequim. 

Te esperei com seu lanche, mas aí já era tarde. Acordei do sonho querendo que tudo fosse real. Engano meu. Olho no relógio e os ponteiros marcam 03h da madrugada. Tento dormir com fome e sem você. 

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